quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Visita a M. de Barros



Ah! se um vaga-lume
no tempo d`eu menino
tivesse me ensinado
a voar fora da asa...

mas eu não aprendi
agora estou aqui
somente um caramujo
um caramujo morto...


Oz
Janeiro de 2004

domingo, 21 de setembro de 2008

Sonâmbulos



Dois corpos na noite densa
lamentos banhando os lábios
olhares dentro da névoa.

Aves vorazes, sedentas
promessas tecendo as horas
o manto gris sobre a alcova.

Dois corpos tremeluzentes
dois sonhos rubros, dementes.
O pacto.

Na noite densa, dois corpos
na noite, vivos e mortos.
Intactos.


Oz
13.03.03
Olhos de ressaca



A vaga do mar lá fora
cá dentro meus devaneios
argênteos bicos de seios
crepúsculos, transas, auroras.

A vaga do mar cá dentro
lábios vadios, vermelhos
dinossauros e coelhos
fauna, flora e sentimento.

O desconhecido louco
cadáver carnavalesco
pesticidas e insetos.

Torres, tróias, arabescos
deuses, razões, objetos
cá dentro de tudo um pouco.


Oz
17.09.98
Caçada


I



Em busca de abrigo
o corpo vaga insone
num êxodo constante.

A mão semeia o trigo
&
o joio jaz, tão vivo.

A pele ardendo em febre
num arcabouço misto
de dor e encantamennto.

É caçadora e lebre

A caçada prossegue.

II

Em busca da resposta
a mente vaga, insone
num êxodo constante.

O sal sobre a ferida
os lábios sobre os lóbulos
a pele ardendo em febre.

Na noite a luz se banha
e o homem emaranha
a noção de pecado.

A mesa está posta
a fome, insinuante
o verbo, amordaçado.

Oz
27.03.01

sábado, 20 de setembro de 2008


Retôrno à Kandarar

I

Vejo a luz banhar o teu corpo.
Sinto a tempestade.

Tua pele incendeia minha razão entorpecida.

Pérolas cintilantes em tua face
fagulhas no ar deste outono gris e eterno.

Meu desejo é uma nau cravada nos teus seios.
Queres o que quero no entanto foges.
Eu sei que estás por perto.


II

Tua inocência: um bosque esquecido em nenhures,
por ele, cavalgo, alucinado, rumo ao Olimpo,
no fundo, sei que és apenas uma miragem...

Na manhã outonal
um zéfiro enlaça-a levemente.
Poderia chamá-la Lilith
conheço-a e venero a tua descendência excomungada e milenar.

III

Minha trilha adentra tuas fronteiras;
um sítio inexplorado e esplêndido;
perco-me nas clareiras do teu corpo;
somos, na manhã, um só corpo; um só espírito insone sob a névoa;
sobre as folhas caídas no solo;
somos um só dentro do sonho purpúreo.

IV

À tarde, soluçavas encolhida no tombadilho..
Tempestades de areia feriram teus olhos...
Teu colo seria devorado, pouco depois, por hienas vorazes...

V
Calaram-se os cantos na terra desolada
ausentaram-se os deuses delirantes do deserto.
Deixei a ti os meus versos e mais nada.




Oz
Enquanto chove

Para a pequena ex-habitante da CEU 3



Por ora é só
Não preciso mais de ti aqui
Então quero ver você partir
Buscar-te-ei se acaso precisar.

Por ora basta
Teu beijo infante aplacou minha sede
Mas teu olhar prendeu-me na tua rede
E eu não consigo preservar-te assim tão casta.

De pé vou aguardar minha decadência
E como um cão, lamberei minhas feridas.
Tua lembrança será uma fonte adormecida
Um bálsamo a atenuar a dor da ausência.


È tarde sim. O crepúsculo se avizinha
A visão baça, o andar hesitante
À noite insone, o verbo delirante
A dor do mundo é também a minha

Por hoje é só
Não preciso mais dos teus segredos
Tua ausência deixa-me com medo
Sei que és o vento, e eu, chuva, fogo, pó...

Ozênio Dias

Agosto de 2006

Cristine

Cristine


Olhe garota
tudo que eu queria era te dar um beijo
e depois transar contigo
ouvindo Sara, do Dylan.
Mas, foda-se se isto não foi possível
e eu estou aqui trancado
e tudo parece abandonado
no condomínio azul.
Já não importa muito se fugiu para o Nordeste
ou se continua no apartamento ao lado,
tudo que importa agora são lindas viagens
adentrando florestas cerúleas.
Eu tenho um amigo que me apresentou uma garota órfã
e ela agora parece insaciável.
Olhe garota, vou te contar um segredo:
Eu sou um xamã
Eu sei que você quer voltar
mas...
antes de partir ouça comigo esta canção
e pode chorar..
enquanto isso vou buscar uma bebida
pois, sinto a tempestade se aproximando
(...)




(Um dia qualquer no Cond. Azul, em 95)

Oz

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Abrigo

Palavra é abrigo que busco no caminho
parte da minha tediosa trajetória.
Faço versos de quem pressente a hora
de ser
sozinho.


Oz

Então será tempo...

Quando se apagar em nossos olhos a imagem de pássaros e lebres e riachos e lagos
e as trilhas no deserto estiverem prenhes de seres moribundos, a planície, o planalto, a várzea incendiados, talvez alguém entoe um cântico que ressuscite todo olhar e todo sonho estrangulado no berço...

Quando os últimos raios invadirem as alcovas banhando de luz e fuligem corpos sequiosos,
Quando risos orgásticos e insanos invadirem as almas, as faces verterem lágrimas desnorteadas,
Quando o vôo da pomba for um rastro no rubro e as trombetas soarem executando a dança do
gênese apocalíptico, talvez tenhamos um momento para olhar para trás...

Quando o caminho for único
os olhares ilegíveis
o precipício à mão
o horizonte não
os últimos descendentes de uma estranha tribo talvez sejam vistos vagando à deriva
sobre dromedários bêbados
invocando um deus que há muito se ausentou...

(...)

Oz

1990

De mim

Se quer de mim
mais que um pseudo-riso
DESISTA !!!
Eu sou NARCISO !

Oz

Cavalos marinhos


Você já cavalgou os cavalos do mar de Huxley ?
Eles são faróis incendiando a noite
e adentram de quando em vez o cérebro do homem...

Cavalos marinhos
coloridos de lavas vulcânicas
desfilam ante os vossos olhos
percorrem vales abandonados
e montanhas flamejantes.

Em manhãs fugídias o rebanho cavalga suavemente sob as ondas
crinas embandeiradas na brisa matutina
e anunciam o cálido despertar dos trópicos.
2017.

Longínqua fronteira do milênio inicial.
Toda a tripulação observa maravilhada
o onírico desfile selvagem.


Oz
1995

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Nanáth

Meus sentidos buscam no corpo opaco da noite veredas que me levem aos seres que habitam teus corais.
Sei que levas contigo vestígios do meu riso tímido e dos meus cantos tortos.
( cantos de caos e ternura ).
È certo que em algum outro pôrto te aguardam adornos e reflexos nítidos de constelações de outras épocas.
Danças envolta em pássaros amarelos e azuis e pérolas purpúreas deslizam suavemente pelo teu rosto lúdico.

Deuses vadios da minha infância, não me abandonem !!!

Vago, indistinto, por campos de transição.

( ... )

Do 17º andar dos meus olhos vândalos perscruto salões vazios e quartos de pedra e estátuas de mármore.
È certo que te observo em silêncio. ( o silêncio de desejos inenarráveis ).`

( ... )

Na aparente paz reinante, tua presença é fluído que alimenta o espírito lendário da cidade portuária. E distribui pétalas de begônia no cais a marinheiros bêbados.

Não sei como chamá-la. Vejo-a surgir à distância e trazes contigo uma brisa suave; um zéfiro e sei que podes desaparecer a um toque e me mantenho à distância.

Um dia, talvez no próximo outono, eu me aproxime e talvez eu consiga desvendar teus segredos; segredos que trazes contigo; segredos de ti e da tua estirpe secular.



Oz

Maio de 98

Indonésia

A onda
gigantesca onda
explosiva onda
a onda canibal.


A natureza
a natureza clama
a natureza e o seu berro
letal...


Oz
sexta-feira, 20 de maio de 2005

Da forasteira


Forasteiras insones invadem-me intransigentes, adentram-me pelas frestas dos meus olhos míopes, trazem nos pêlos odores seculares e dizem de cristo e outros tantos profetas. Desnudam-se e me abraçam sinuosas. Beijam-me sofregamente. Canibais ligeiramente bêbadas. Deixam, ao sair, vestígios dos seus dentes afiados e se refugiam em abismos, entre persianas e saxofones.

Estranhas inquilinas temporãs no silêncio destes quartos pétreos.

Na manhã, odores de um campo de batalha.
Na manhã, ventos cervantes.
Na manhã, habitantes de um passado longínquo que o tempo esqueceu.

No pátio deserto, o outono ressona levemente junto a uma fonte em ruínas.


Oz

Setembro de 98

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Prólogo

Hoje retornei ao velho salão das sombras sem memórias, seres dançantes em cores e fuligem. A sentinela postada à esquerda do pórtico das águas recebeu-me em silêncio. Senti temor e êxtase. Meus dias passados em doce melancolia tornarem-se a diversão predileta dos meus fantasmas sombrios, acorrentados em flutuantes grilhões oníricos. Afaguei em lágrimas arcanos e outros cantos tortos, e meus olhos divisaram, ao longe, o semblante impávido de deus.

Tive medo.

Con te

Io, que estou no meio do caminho
quiero seduzir-te a andar comigo
Io, che até aqui andei sozinho
e que, apesar disso, ainda prossigo.

Com o meu fardo avanço e retrocedo
em meio a tempestades invisíveis
envolto em projetos perecíveis
refém de rompantes e do medo.

E ritorno à caverna, ordinário
entorpecido, sinistro, indistinto
o chamado se perdendo na distância.

Con te, quiero habitar o imaginário
e ele é bem maior que este recinto
labirinto a ofuscar a esperança.


Oz
Março ,2005

terça-feira, 2 de setembro de 2008

Cárcere

Meu cárcere é a manchete matutina
fitando meus olhos nas esquinas.
Meu cárcere é o amargo na página indiscreta
mil alfinetadas em cicatriz aberta.
Meu cárcere é a certeza de ter, em manhãs cinzentas
a morte me vigiando, atenta.
Meu cárcere é o doce fardo da inocência
enterrado no esgoto com o rugido da tormenta.
Meu cárcere é o murmurar sutil dos lábios teus
ao ferir minh'alma com um adeus.
Meu cárcere é o teu riso brotando qual flor no campo
pra murchar ao soluçar febril de um pranto.
Meu cárcere é a rua tinta dos vinhos das veias vadias
qual vômito vermelho nas vielas vazias.
Meu cárcere é a indiferença do olhar da humanidade
que com pupilas de aço tomam-te a liberdade.
Meu cárcere é o som silencioso e audível de uma página virada
é o amor que se foi
é uma estrela cadente
é o viver
mais nada.

Breves ???

Mas, que distância haverá
entre o meu e o teu olhar ?
entre a minha e a tua pele
entre a bomba e o homem-bomba
entre a minha e a tua sombra !?
estas distâncias não há!

Mas, que distância haverá
entre o aqui e o lá ?
lá onde a mente divaga
qualquer lembrança se apaga
a tua ausência é amarga...
esta distância não há !

Mas, que distância haverá
entre o nascer e o expirar ?
entre a praia e o infinito
entre o mortal e o mito
entre a mudez e o grito...
estas distâncias não há !

Mas, o que se ocultará
no corpo da ampulheta ?
mas que distância haverá
entre o falso e o verdadeiro
quando este é a metade
daquela outra metade
como um espelho de jade
defronte a estatueta !?

Mas, que distância haverá
entre a alegria e o marasmo
e o corpo queda louco
entre a dor e o orgasmo
qual será a semelhança
entre deus e uma criança !?

Haverá qualquer distância
entre mim e o Sancho Pança ?

Estas distâncias não há !


Ozênio Dias

01.02.02

BALADA DA NOITE

A noite nunca passa
a noite enlaça ao longe
assim, se a noite chama, oculta na passagem
à espreita, insone, a noite ressurge
e é miragem.
A noite não espanta
a noite envolve, encanta.
Desliza sorrateira num ciclo singular
de luz & sombra & luz
e deixa na sua esteira
um ressoar de um canto inacabado, insano
àquele que virá.

Enquanto tece a luz que surgirá
no vão
da noite incipiente o homem que era então vidente
vaga à sombra da noite que chegou
fugaz
anoitecido.


Ozênio Dias

de lírios e conchas

" O corpo é uma máquina desejante "





Pudera eu explorar a tua concha
nela penetrar os mais íntimos cantos
esquecer todo o resto
mergulhar
lambuzar-me
viver...
Explorar o teu ninho
pudera eu delirar em tuas curvas
neste delírio da carne pecar...
Pudera eu me calar..
não precisar escrever
escavar
ter apenas um pouco de ti
mas não sei.
Pudera eu permanecer inocente
mas existe o meu medo
(e desejo)
e a tua concha vermelha
( e caliente ).
Pudera eu...
mas não posso
e não sei
sem saber, não sabor...

E uma mente inundada de lírios
& conchas...




Oz

Do destino

O amor contém tanta loucura
uma mãe amamentando o filho morto
um ançião soletrando as escrituras.


O amor requer transbordamento
a lágrima que caindo inunda o poço
na poeira redesenha o firmamento.


Nada está tão distante quanto o outro
a sombra que te habita cristalina
é a memória no baú do esquecimento.


No cálice desta tarde o sofrimento
é sorvido e absorve um mar revolto;
Navegar neste mar é a tua sina.


Ozênio Dias
25.05.2003

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Índice

3. sem graça
4. à toa
5. uma quase conclusão
6. cotidiano
7. convite
8. confissão etílico-amorosa
9. sonâmbulos
10. canção noturna
11. versos pagãos
12. de recifes e pecados
13. quase bem-querer
14. memória
15. descoberta
16. aquele quarto
17. diagnóstico
18. élis
19. de redenção e espera
20. do inevitável
21. fragmentos
22. fragmentos 2
23. de caminhos
24. sete
25. proscrito
26. novos tempos
27. sentença
28. espera
29. olhar em volta
30. entardecer