quinta-feira, 20 de março de 2008

De recifes e pecados

Quero sorver aos poucos o teu olhar demasiado fonte. Aos grandes goles eu me afogaria.
Tentei me proteger sob o vasto manto da indiferença mas esta me desnudou e ora permaneço despido no meio desta tarde que arde em contornos purpúreos a delirar e, delirante, lanço
mão do verbo; verbo,asa que me pesa e talvez me liberte e talvez me mate numa queda fugaz e
fatal.
Quero sorver aos poucos o teu corpo; oceano repleto de recifes, sargaços e pecados onde vagam eu e a minha nau, sob um céu um tanto gris e uma tripulação bastante familiar: o medo, o desejo
e a solidão.
Sorver aos poucos teus outonos, invernos, tuas estações; levemente, como um pequeno demônio levando pelas mãos as filhas diletas de Zeus pelas veredas ocultas no Olimpo.
Aos poucos, sorver as tuas diáfanas retinas, vitrais que refletem em almas transeuntes os herdeiros de uma estirpe estranha e secular.
Sorver mansamente a tua lembrança presente no meu espírito insone e cansado.
Minha sede saciada após dez milênios medidos na clepsidra dos teus mais íntimos segredos e medos e tudo o mais que herdastes da eternidade.

Ozênio Dias

19.07.06

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